sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

desabitada

Eu poderia acordar um dia e ver tudo fora de mim: rins, pulmões, nervos, vértebras, tudo flutuando pelo quarto.
acordaria, e meu ouvido estaria colado no teto. os líquidos todos a correrem pelas paredes.
o meu útero encostado na maçaneta da porta, prestes a sair. os olhos dentro do sapato de verniz preto que comprei na italia.
poderia acordar toda assim. cada pedaço num lugar. daí, eu me levantaria, tomaria meu nescau de frente para a minha nuca, que estaria ali, me fazendo companhia.
desceria as escadas, encontraria meu fígado na esquina da conceição com a rua dos fanqueiros. entraria na sala de ensaio e meus ossos das pernas e braços estariam dançando, dando saltos incríveis, inimagináveis, impressionantes. daí eu riria... e ficaria assim, aconchegada em cima da minha própria pele, respirando até as minhas costelas explodirem.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

para versejar

se ainda achares graça
permito-me de aqui ficar
e se ainda assim fizeres pirraça
convido-te a com estas palavras dançar.

pois só quedei-me nesta praça
para o meu coração acalmar
que de tantos rios que por ele passa
fez de outro o seu compassar

de onde tal afluente se entrelaça
vejo meu corpo a transbordar
se em mim houver desgraça
convido-te a esta cachaça provar.